sábado, 27 de fevereiro de 2016

Sessão Contos Bizarros: O Padre Que Duvidou de Deus


Eu era menino quando um tio meu que cursou o seminário em São Paulo me contou esta história. Dizia ele que conhecera no mesmo seminário em que havia entrado para seguir a carreira sacerdotal, um rapaz de nome Saulo.
Irônico, pensava meu tio, que o nome do rapaz fosse correlato ao personagem bíblico que perseguia e matava cristãos antes de se converter. Saulo ( o moço e não o personagem bíblico) vinha do Ceará, terra do Padre Cícero, de fé fervorosa e povo sofrido pela seca.
O rapaz era mirrado, usava óculos de grau e tinha um cabelo meio 'lambido' de lado. Falava muito pouco e sempre andava de cara amarrada pelos cantos. O reitor do seminário achava o rapaz deveras estranho, mas já que veio para encontrar o caminho de Deus, era melhor deixa-lo em paz.
Passado dois meses algo inesperado aconteceu: uma imagem de Cristo crucificado feita de madeira e pintada à mão, bem ao estilo barroco mineiro havia chegado sendo uma doação de um devoto para o seminário. Logo todo os estudantes não acharam a imagem muito bonita. Para muitos o Cristo estava muito estilizado, quase caricatural, nem de longe parecia o filho de Deus.
Vendo que ninguém gostou da imagem o reitor resolveu coloca-la em uma parte do pátio do seminário bem longe da vista de todo mundo. Ignorada, a imagem ficou pegando sol e chuva durante uns três meses e ninguém se preocupou com ela. Quem de vez em quando parava para admira-la era o Saulo. O rapaz soturno ficava horas olhando para a imagem (teve gente até que viu ele se ajoelhando e falando com ela).
Algum tempo depois aconteceu de Saulo ficar doente. O medico de uma cidade próxima da cidade veio visitá-lo.
Depois de um longo exame descobriu que ele estava com pneumonia. O medico disse que ele pegou muito frio e chuva. Com razão, Saulo muitas vezes ficava ao relento admirando a imagem que todos os outros estudantes achavam horrorosa. Foi nestas situações que pegou pneumonia. O medico passou os medicamentos e pediu que se algo acontecesse ele fosse chamado imediatamente. Porém, ele sussurrou no ouvido do reitor que talvez, o rapaz não passasse de alguns dias e o melhor seria notificar seus parentes de sua possível morte.
Dito e feito. Passado dois dias Saulo faleceu. Seus parentes foram acionados e chocados levaram o jovem e seus poucos pertences para o Ceará. A história toda poderia ter terminado aqui, mas ninguém imaginou o que viria depois.
Passado sete dias de luto da morte de Saulo e um fenômeno passou a ocorrer no seminário. A imagem do Cristo que ele tanto admirava começou a sangrar do nada. O chão ao redor da imagem ficava ensopado de sangue que vertia dos olhos e do ferimento do lado do cristo de madeira. Os estudantes ficaram alarmados com o ocorrido.
O reitor chamou o bispo para ver a imagem. Com surpresa o sacerdote pensou que fosse um trote e repreendeu os alunos. Porém, o fenômeno continuou por vários meses seguidos. O reitor não sabia mais o que fazer e pediu para o bispo pedir uma assessoria do Vaticano para entender o que estava acontecendo.
Enquanto o Vaticano não autorizava uma investigação sobre o caso o reitor tentou descobrir por ele mesmo o que estava havendo. Foi até o quarto onde Saulo ficava. Procurou por algo que pudesse explicar o fenômeno. Depois de tanto vasculhar o quarto encontrou uma carta de Saulo que estava escondida atrás da cômoda próxima de sua cama.
Com os olhos cheios de lágrimas e chocado mais tarde o reitor leu para os alunos o achado que estava escrito com uma grafia nervosa:
" Senhor.
Sei que vim para o seminário te encontrar, mas não encontrei nenhum sinal de Ti.
Penso que foi bobagem minha lhe procurar. 
Vejo todos os dias uma imagem sua feita de madeira, talvez, eu seja o único a ver uma 
beleza em algo tão banal.
Teu rosto é triste e feio, seu corpo é roto e sem nenhum sinal de graça ou de luz.
Talvez, seja a melancolia me atacando, mas eu estou perdendo a fé em ti.
Se Tu realmente existe faça um milagre diante de mim, pois estou duvidando de Teu 
Poder."

Com estas palavras Saulo de despediu do mundo e nem pode ver o milagre que tanto pediu a Deus.

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