sábado, 25 de junho de 2011

Sessão Quadrinhos: Batman X A Garagem Hermética

     
Eu já relatei o meu apresso aos quadrinhos neste blog. De certa forma foi o fascinio pela arte sequencial que me fez gostar de artes . Quando criança eu escrevia e desenhava minhas próprias estórias, na maioria das vezes me inspirava em personagens de seriados japoneses tipo Espectreman ou Jaspion do que nos herois norte americanos. O porque deste fato nem eu mesmo sei explicar, a primeira revista que li aos meus sete anos foi uma edição do 'Capitão América' em 1979. Um personagem totalmente propaganda dos EUA. Depois veio o Homem-Aranha, o Super Man até chegar na inocência de uma Turma da Mônica e Recruta Zero.
    
De repente assisti na tv os desenhos do Speed Racer e os monstros de borracha esmagando maquetes no seriado do Spectroman. Cara! Aquilo era totalmente surreal e divertido. Nada de bandeira americana tremulando no vento ou vilões com planos malevolos para assaltar um banco. Tudo se resumia em mostrengos radioativos destruindo prédios e robos gigantes (os Transformers não são nenhuma novidade).

Depois de ver desenhos e seriados japoneses comecei a desenhar as minhas proprias revistas (cheguei a desenhar e escrever no mínimo umas 20 ou 50 na infãncia). Tudo era simples e bem movimentado os roteiros eram super pobres e o negocio era desenhar os herois esmurrando os bandidos sem dó ou piedade!
Na adolescencia meio que cansado de ler os gibis de super-herois, um amigo me apresentou aos quadrinhos chamados adultos. Foi quando conheci o Conan o simério violento e de poucos amigos e as revistas européias da Heavy Metal. Um véu caiu dos meus olhos: mulheres sensuais, aventuras em outros planetas ou dimensões paralela, surrealismo e muita temática existencialista!
Os quadrinhos europeus eram e são tudo aquilo que os gibis americanos deveriam ser: inteligentes e quase obras de arte em celuloide. Personagens como Ranxerox, a tentadora Drunna e os contos surreais da Garagem Hermética deixam o Homem-Aranha e suas desventuras no chinelo! Fora a qualidade grafica e dos trabalhos artisticos de caras como Moebius que de tão fantásticos enfluenciaram os filmes norte americanos em estética como no filme Blade Runner e Robocop.

Hoje em dia o cinema tenta capturar a estética dos quadrinhos seja em filmes com 300 ou SinCity, de toda forma existe um mundo muito além de mutantes e fantasiados voadores.

sexta-feira, 24 de junho de 2011

Monografia de pós-graduação Parte VI

Além de a história ter como características a forma da tragédia grega, também tem um cunho de nacionalismo, usando a mitologia para justificá-lo. Dante se transforma em Enéas, não somente por sentir uma ligação inspiradora na obra de Virgilio, mas também por ser um nacionalista. Sua obra transpira sua paixão e frustração sobre a sua cidade Florença que o expulsou, sendo assim se sente um ‘sem pátria’ assim como o troiano Enéas. Ao mesmo tempo tenta resgatar os ideais que fundaram a Itália. Os ideais de uma nação mítica fundada por um herói grego.
No momento em que Dante convoca Virgilio para guiá-lo assim como a Sibila guiou Enéas no inferno, o poeta florentino está legitimando sua obra e colocando-a no patamar das grandes obras gregas dos poetas que lhe influenciaram como Homero. O inferno dantesco tem as características dos infernos que apareceriam em trabalhos artísticos de pintores como Bosch: uma fusão de visões aterradoras laicas e judaico-cristãs.
No mesmo inferno em que se encontra as fúrias, os centauros, Cérbero, Plutão, Minotauro, Titãs, o monstruoso Gerião e ciclopes está também o anjo caído Lúcifer e sua legião de demônios bíblicos. Logicamente Bosch não pinta os monstros gregos, mas não esconde os elementos laicos que estão na sua obra - os Provérbios Holandeses - bem como uma visão particularizada de fé.
Realizando outra analogia da Divina Comedia com a Eneida, podemos extrair uma citação da obra de Virgilio traduzida pelo historiador e escritor Thomas Bulfinch em seu livro O Livro de Ouro da Mitologia (2006): “Enéas avistou um lado das muralhas de uma poderosa cidade, em torno da qual fluem as águas furiosas do Flagetonte. Diante deles estava a Porta Diamantina, que nem os deuses nem os homens podiam atravessar. Junto à porta erguia-se uma torre de ferro, na qual Tisifone, a fúria vingativa, mantinha-se em guarda. Da cidade vinham os gemidos e o ranger de dentes (...)” (BULFINCH, p. 344, 2006).Cena quase semelhante é relatada por Dante em sua obra, no Canto IX de sua Divina Comédia:

“Outras palavras disse ainda das quais não me recordo, pois fixara os olhos no cimo da chamejante torre onde surgiram, com horripilante aspecto, três Fúrias, tintas de sangue, feminis nos membros e nos gestos, de verdes hidras cingidas, e por cabeleira ostentando serpentes e cerastas enrodilhadas na fronte” (DANTE, CANTO IX, p. 42).


Poderia relatar outros pontos semelhantes nas obras como o Campo Elíseos que aparecem com seus personagens e a presença da cidade infernal Dite. O que importa é a ideia de expandir a obra de Virgilio, como bem atestou Hilário Franco Júnior, Dante pretendia que sua obra fosse para as massas e rompesse assim o poder hegemônico do latim como um idioma universalizante como pensara a Igreja em ter uma nação cristã unitária e esquecendo dos diversos dialetos que cada região da Europa possuía. De certo Dante fundamentou a pedra da valorização do dialeto toscano que desembocaria no italiano e mais tarde junto com o alemão e o inglês derrubariam o latim.
De toda forma a divulgação da Divina Comedia traria as obras dos grandes poetas épicos à tona e assim como ocorreu com Dante traria muita influência nos escritores futuros, como bem atesta Thomas Bulfinch ao perceber que o tema do inferno já fora esmiuçado por Milton em seu Paraíso Perdido.
A influência da Divina Comédia como obra maior do Ocidente moderno nos faz verificar pontos importantes de acordo com o professor de literatura Andréa Lombardi em seu artigo Um Corpo que Cai (LOMBARDI, p. 19). A obra de Dante expressa arquétipos úteis para compreender a cultura contemporânea: existe a redenção, o castigo diante das ações, o humanismo e a valorização do trágico grego com a fé judaico-cristã. Podemos perceber o eco de Dante na contemporaneidade na ‘literatura de testemunho’, onde o autor se coloca como o eu da história sem interlocutor.
A homenagem à cultura grega não seria totalmente um resgate saudosista como se Dante, quisesse voltar ao passado. Quando ele encontra Homero o escritor da Ilíada no Limbo, está não somente colocando-se entre os grandes clássicos, mas, antes de tudo superando-os. Por isto, a cena do Limbo não é somente simbólica sobre o Inferno, porém, uma separação entre o passado e o presente, onde Dante deixa os seus inspiradores para trás. 
Se Dante percebe que pode seguir além deixando suas influências para a posteridade, um sinal do individualismo, ele acaba com esta atitude representando todo os humanistas. De acordo com o Historiador Guilhermo Giucci em Viajantes do Maravilhoso: O novo mundo (1992, p.14), o poeta florentino parece espelhar o sonho do homem do novo tempo que não mais se convence ou que se basta com o mundo que lhe é apresentado. Se Dante navegou no lago Aqueronte e descobriu lugares exóticos, o mesmo ocorre com os navegadores como Fernão de Magalhães e outros que iam procurar um lugar além mar. 
O mirabilia (o maravilhoso) onde o europeu deposita uma visão mágica está nas terras desconhecidas além dos limites da Europa. Antes de Dante já havia histórias e lendas de viagens para outros mundos, alguns iam de barco como Dante fez guiado por Virgilio, outros iam a cavalo. Lendas onde um viajante encontrava um ‘paraíso perdido’ cheio de riquezas e rios de leite e mel. Giucci relata do mito de São Brandão (1992, p. 36-37), monge argonauta que teria encontrado um mundo além mar com as características citadas acima, onde o barco era Deus e o monge o seu fiel que seguia seus preceitos e que por isto, como recompensa chegava ao Paraíso. Na verdade a lenda de São Brandão era uma fábula uma paidéia (educação) para catequizar os fiéis.
Provavelmente Dante devia conhecer esta história para redigir o seu Purgatório, uma ilha acima do mar que serviria de elo entre a terra e o paraíso celeste. Havia também uma versão educacional sobre a viagem de Ulisses e sua intrépida aventura narrada por Homero. Dante o coloca no Inferno, com se fosse um castigo para muitos religiosos da época. A imagem de Ulisses suscitava desobediência, e assim a aventura do grego argonauta em vez de simbolizar um herói que cruzou os mares da vida, era convertido em um desafortunado que fugiu à lei divina. É totalmente complexo e contraditório, ver Dante exaltar a cultura grega e ao mesmo tempo vê-la como um oposto negativo a sua fé. Mas, não podemos esquecer que ele vivia a crise de um tempo que findava enquanto outro iniciava uma transição dolorosa para os homens do medievo, pelo menos em termos existenciais.

2.3- O Inferno dantesco

            Se existe obra onde a imaginação parece ser atiçada, é a Divina Comédia de Dante. A sua divisão entre Inferno, Purgatório e Paraíso; e como descrevia cada passagem faz qualquer leitor ver as criaturas e lugares mais fantásticos. Segundo a professora Aurora Bernardini em seu artigo Divina Viagem (BERNARDINI, p.46-51) instiga o leitor em três vias: a do olho, a do pensamento e a da memória. Com o olho vemos com descrição minuciosa cada lugar do Inferno desde o rio Aqueronte até a cidade de Dite, das escadarias do Purgatório até a Rosa Mística no Paraíso. Tudo é descritivo e literalmente traz sensações que vão além do visual. O pensamento nos leva a questões teológicas, filosóficas e a memória a evocações do passado (os expoentes gregos), o presente (os fatos de época narrados como uma crônica) e o futuro (a esperança do homem do medievo no fim da vida e ir para o Céu).
O olho será o ponto de discussão aqui. Pois, inúmeros artistas tentaram levar o que Dante escrevia em imagens, artistas como Sandro Butticelli (1445-1510) (fig. 03), Francisco de Goya (1746-1828), William Blake (1757-1827), Eugene Delacroix (1798-1863) e Gustave Doré (1832-1883) (fig. 02). Estes artistas desenvolveram obras de muito valor sobre o poeta florentino. Destes, o destaque de análise será Botticelli. Esta escolha tem dois motivos: Botticelli era renascentista e como humanista posterior de Dante. É interessante saber que os renascentistas cultuaram a Divina Comédia o que resultou em trabalhos que se amalgamaram a obra.
Voltando a obra de Dante, a necessidade de ter ciência que seu trabalho por ter sido escrito em toscano e por tocar em assuntos teológicos, A Divina Comédia chegou a ser rejeitada pela Igreja. Posteriormente Dante pediria desculpas a cúria romana por ter feito a obra. De certa forma é irônico saber que a obra acabava fazendo uma propaganda do catolicismo, divulgando o belicismo que a Igreja tanto exaltava na comunidade. Tanto é verdade que as ilustrações do Inferno eram muito conhecidas. Monges de diversos monastérios copiavam e divulgavam a Comédia (que seria divina mais tarde) quase com o mesmo valor religioso da Bíblia. Muitos burgueses tinham exemplares em suas casas da obra de Dante o que levou o poeta a ser o mais popular em seu período.
Por estes fatores, pode-se supor porque as ilustrações do Inferno foram mais divulgadas que as do Purgatório ou do Paraíso. Há muitas ilustrações desta parte da obra. Escrita durante a Quaresma, Dante cria uma viagem que como foi mostrado era inspirada na Eneida de Virgilio. Por isto, os monstros mitológicos presentes no Inferno, na verdade não é o Inferno de ranger de dentes bíblico e sim o Hades. Como também foi comentada a imagem do Diabo, não é determinada nas escrituras, mas uma junção de imagens de criaturas do mundo laico como relata Luther Link:

‘Lúcifer já foi belo hoje é feio’ lembrou Dante a seus leitores, mas somente a feiúra e maldade de Satã estiveram na mente dos crentes, pensadores, escritores e artistas durante mais de mil anos. Até mesmo Botticelli, amante da beleza, desenhou uma fera repulsiva para Lúcifer de Dante. É verdade que o fez para ser condizente com o texto de Dante, mas ainda assim quase todas as pinturas e manuscritos iluminados da Idade Média e Renascença mostram um Satã hediondo. (LINK, 1997, p. 32).

De acordo com a historiadora de arte Paula Vermeersch em seu artigo A Selva da Visualidade (VERMEERSCH, p. 76-83) o pintor florentino sob encomenda dos Médici iniciou uma trabalhosa tradução em imagens do Inferno e assim como Dante, Botticelli também é florentino, sente as guerras internas na cidade e a crise do humanismo o que lhe faz identificar com as obras do poeta.
Sandro Botticelli ou Alessandro di Mariano di Vanni Fillipeli (seu nome de batismo real, já que o Botticelli herdou de um irmão mais velho) estudou com Fra Filippo Lippi (1401-1469) aos 17 anos. Trabalhou temas religiosos para o papa Sixto IV (1414-1484) e teria maior visibilidade ao realizar trabalhos de cunho mitológicos para os Médici. Dentre estes trabalhos o Nascimento de Vênus para Lorenzo di Pierfrancesco, primo de Lorenzo o Magnífico. Devido à liberdade de expressão artística que tinha com os Médici, pôde trabalhar os temas mitológicos gregos que eram conhecidos mais em literatura do que em imagens para os pré-renascentistas.
Simpatizante das ideias reformadoras religiosas do frade dominicano Savonarola (1452-1490) se tornou um crítico da Igreja, o que pode ter lhe aproximado dos trabalhos de Dante. Segundo H. W. Janson (1986, p. 201-202) os trabalhos de Botticelli se aproximam do que seria mais tarde o Maneirismo, com as suas mulheres esguias e leves. Outro ponto seria a despreocupação com o fundo em relação às figuras do primeiro plano como ocorreu na Vênus, o que seria também um resquício de influência da arte medieval pouco dada a detalhes anatômicos e sim na força da cor e no didatismo. Mas isto transparece em seu trabalho na Comedia?   
Como renascentista percebe-se a preocupação com a anatomia humana nos corpos retratados, cada movimento de cada personagem, são poses pensadas e lembram o estatuário grego. O poeta e mentor Virgilio ganhou um ar de rei com roupas azuis e uma coroa de monarca. Em oposto a idealização de Virgilio, o Dante de Botticelli não é diferente dos que já apareceram em outras ilustrações de diversos artistas. Botticelli tem uma visão muito particular da forma humana, tanto que sua Vênus esguia de sua obra mais conhecida é símbolo visual da Renascença. Um outro ponto importante é como Botticelli narra cenas. Parece gostar mais das que ele pode expor muitos modelos em posições diferentes. Uma inovação talvez, seja em mostrar em seqüência os personagens de Virgilio e Dante assistindo e comentando o que veem no Inferno como bem mostra a ilustração. Os demônios de Dante são híbridos tipicamente laicos: um monstro com patas de cão, asas de morcego, rosto de dragão e seios de mulher. Botticelli chegou a desenhar vários esboços e muitos viraram iluminuras, o que denota uma dedicação ao tema.

sábado, 18 de junho de 2011

Mestre Vitalino: O Artista do Povo


Está acontecendo uma exposição das mais importantes para nós brasileiros no Museu da Republica. Trata-se da exposição do Mestre Vitalino. Para quem não conhece ou não tinha tanta intimidade (como eu) a exposição mostra os trabalhos deste que foi um dos maiores ou senão do maior escultor de projeção nordestina.

Longe do mundo acadêmico, e da escola, Mestre Vitalino era filho de humildes agricultores do sertão nordestino. Enfrentando todas as dificuldades financeiras o mestre começou a criar suas primeiras esculturas de argila que tirava de um açude proximo a sua casa. Como os seus pais eram muito pobres ele fez da vontade de criar seus proprios brinquedos de argila em arte.
Ele passou a vender suas obras na cidade e depois ensinar a confecção das estatuas de argila para os filhos. Com o tempo os trabalhos de Vitalino passaram a ser reconhecidos a ponto de pessoas fora do nordeste se interessarem pelas suas obras. A fama o levou para conhecer São Paulo, Rio de Janeiro e ter seus trabalhos citados por intelectuais como José Saramago.

Ironicamente, o mestre morreria pobre e doente no meio do sertão precário e sem saneamento básico e nem hospital público. Depois de sua morte vários artistas do nordeste passaram a imitar a sua arte a ponto de sua influência ser chamada de artesanato vitalino. Hoje em todo nordeste, do Piauí até a Bahia, varios artistas ganham projeção internacional  e tem seus trabalhos em museus e galerias de arte, tudo graças ao pioneirismo do Mestre Vitalino.

Tendo como tema o dia  a dia dos retirantes, do caboclo e dos povoados, Mestre Vitalino registra em argila a religiosidade e toda a fé do Nordeste. As peças são como uma história assim como ocorre com os quadros dos pintores, o mestre nunca fazia peças individuais a não ser quando fazia os seus bois que se tornaram simbolos deste artesanato ao lado da imagem do Padre Cícero e Lampião.
  

quinta-feira, 16 de junho de 2011

A Crônica das 'Crônicas'


"Eu canto em português errado e acho que o participio não participa do passado". É com um dos versos de uma das músicas do poeta Renato Russo que resolvi falar de uma coisa que gosto muito e me custa demais: a escrita.
Está ocorrendo em Brasília o projeto 'Escritores Brasileiros', um projeto que envolve o nucleo cultural do CCBB e tem participação do SESC. Até o momento travamos um contato com cronistas que para  muitos eram desconhecidos, ainda mais se você não lê as crônicas publicadas em veiculos de grande circulação como O Globo, A Folha de São Paulo, O Estadão e revistas como Criativa, Marie Clarie e Veja.
Ontem conhecemos o escritor Fabricio Carpinejar, que me atraiu para ler suas missivas através de sua irreverência e bom humor. Ele brincou com a imagem do 'gaucho-machão' com um personagem que criou para legitimar a sua ideia de escritor: o escritor dever ser diferente, um paradoxo dentro da sociedade e não ser um comum.
Se voltarmos na história da literatura veremos que Carpinejar continua uma tradição de escritores excentricos e essenciais como Frans Kafka, Edgar Allan Poe, Cruz Sousa, Marllamé, Dante, Lima Barreto, Clarisse Linspector, Paulo Coelho, Oscar Wilde...um universo de emissores de mensagem que se misturam entre a propria enviada e o leitor que a recebe.
   
Mas o que é uma crônica? Ouso essa palavra há muito tempo e nunca consegui capturar a sua definição. Me lembro que a primeira crônica que li foi do Affonso Romano de Santana no Correio Brasiliense em 2007. Ele falava de Marcel Duchamp e seu famoso urinol. Foi desta crônica que tive inspiração para escrever minha monografia de curso de licenciatura em artes. Mas continua a pergunta: O que é uma crônica afinal de contas?!
Homero foi o cronista da guerra de Troia, Dante foi o crônista da sua viagem do Inferno ao Paraiso, Camões foi o crônista da saga portuguesa. Todo cronista relata um fato que está ocorrendo naquele momento mesmo que este fato depois vire passado. Ninguem tem certeza se Homero realmente viu a guerra de Troia, mas seu relato é como de um participante do fato. É improvavel que Dante tenha ido ao mundo sobrenatural, mas o seu relato na época assustava e fascinava os seus contemporãneos. Quando o cronista conta um fato por mais banal que pareça ( uma ida ao restaurante, uma mulher que dorme no ônibus, o sogro que é mau-humorado) ele está falando de algo que ele viu, sentiu e de forma direta ou indireta participou. É uma fofoca, que vira boato e depois torna-se verdade.
Talvez em minha total ignorância jamais irei saber o que é afinal uma crônica, porém acredito que todo mundo é cronista de sua vida e da dos outros.

quarta-feira, 15 de junho de 2011

Exposições 2011: Vik Muniz 3D

Nunca se falou tanto de meio ambiente e sustentabilidade como nos dias de hoje. O crescente caso de catastrofes naturais como erupções vulcanicas, tsunamis e terremotos em varias partes do mundo; fez a humanidade ter a percepção de que algo está errado com a Terra e como lidamos com ela.
Ontem estive em uma palestra em que o convidado especial era o fotografo e artista plástico Vik Muniz. Para muitos que não estão no mundo das artes o nome deste artista pode não ser familiar, mas para quem já viu suas obras hoje expostas em campanhas publicitarias, filmes e até novelas, reconhece o valor artistico de suas obras.

Ele ficou mais conhecido do público depois que fez a abertura da novela 'Passione' da Globo e também por ter feito o retrato de Arnaldo Antunes e Marisa Monte  para a capa do CD 'Tribalistas'. Além , de propagandas publicitarias. Morando ha muito tempo nos Estados Unidos, é um artista consagrado e tinha tudo para estar "curtindo" o luxo da fama que tem. Porém, ele usou de seu prestigio para fazer um projeto de cunho social.
 
O documentario 'Lixo Extraordinário' que concorreu ao Oscar deste ano, mostra o processo de criação do artista com a participação dos catadores de lixo de um lixão no Rio de Janeiro. É neste ambiente insalubre que ele cria releituras de obras famosas com o uso de tudo aquilo que a sociedade de consumo descarta: pedaços de sucatas, brinquedos, eletrodomésticos... tudo se transforma em arte para Vik Muniz.
O interessante é que ele comenta que o filme não tinha a intensão de ser um trabalho de cunho ambiental e sim artistico. Na palestra havia docentes e pessoas ligadas em  projetos de inclusão social e de projetos de sustentabilidade o que mostra que Vik Muniz não percebeu a real força de seu trabalho.
 
A maneira como ele transforma descarte em obra de arte, está influenciando educadores e trabalhadores, o que mostra que a arte não está desvinculada da realidade ou presa entre quatro paredes de um museu, ficando estático ou petreficado para o tempo.

A exposição 'VIk Muniz 3D' que esta no Espaço ECCO (701 Norte, ao lado da consecionária Jorlan), mostra que tudo o que ele toca ou fotografa vira algo novo e desconcertante. Coisas que consideramos banais ou comuns ganham vida nova nesta exposição que vale apena ser vista.

domingo, 12 de junho de 2011

Monografia de pós-graduação: Parte V

As visões do Inferno e o temor do castigo divino fizeram que tanto o camponês iletrado quanto o rei ou o sacerdote, tomassem medidas rígidas sobre suas ações. As penitencias em relação ao sexo e a avareza parecia serem as principais causas da descida do homem para o fogo ‘eterno’. Por isto a força visual da descrição do Inferno de Dante, que para os seus contemporâneos poderiam ser reais e os trabalhos de Bosch como a própria já citada Tavola dos Sete Pecados com o olho inquisidor de Deus no centro enquanto Jesus Cristo se mostra fora do sepulcro e vertendo sangue da costela perfurada pelo centurião romano durante a crucificação.
 Ao redor do olho divino os sete pecados detalhadamente pintados mostrando no dia a dia da comunidade: homens irados lutando, mulheres vaidosas diante do espelho, gulosos que comem vorazmente, casais que se deleitam no campo enquanto bobos da corte animam o que seria um principio de bacanal, dorminhocos enquanto o tempo passa, homens que se apegam às riquezas e deixam outros com penas duríssimas. O olho de Deus vê tudo e Bosch não deixa por menos em sua forma de narrar eventos quase simultâneos ao redor dos sete pecados a morte e o flagelo no Inferno, enquanto Jesus e seus anjos acolhem os que seguiram o caminho da retidão na porta do Paraíso. No fim, Jesus triunfa com sua milícia celestial de Serafim e acompanhado dos apóstolos e santos. Não deixa de lembrar o Canto XXXII de Dante.
Voltando ao poema dantesco que fala da Igreja e suas falhas por meio da metáfora da meretriz, o gigante e a águia. Dante seria para muitos historiadores um saudosista deste período em que a fé católica dominava a arte. De certa forma nestes períodos (mas especificamente no século XII e XIII) na chamada Alta Idade Média, o poder da Igreja mascarava a face imperfeita dela. A teologia católica era o único saber e toda as outras formas de pensamento eram vistas como heréticas, dignas de castigos severos. Tudo para expurgar o ‘demônio’ que havia levado o indivíduo a duvidar ou pensar além dos dogmas defendidos pelo clero. Se Dante sintetiza a mentalidade medieval: a visão sobrenatural do universo, o simbolismo, o belicismo, o contratualismo e a hierofania. Toda a forma expressiva de arte da Idade Média não deixará de fazê-lo, com bem atesta Bosch em suas pinturas. 

2.2- Dante o poeta do imagético

            Em muito de seus livros Dante está identificado com seu manto vermelho e uma coroa de louros, aliás, a coroa de louros identifica como foi dito os que desejam a fama e a glória, no caso de Dante a glória é estar entre os grandes poetas clássicos. Mas, Dante é antes de tudo um enigma de seu tempo. Como definiu William Manchester, Dante seria um vanguardista em sua época junto com outras personalidades que de certa forma abriram as portas para a Renascença:

É impossível fixar uma data para o início do Renascimento, mas a maioria dos estudiosos acredita que suas primeiras manifestações começaram a aparecer no início do século XV. Embora Dante, Petrarca, Boccaccio, São Francisco de Assis e o pintor Giotto de Bondone-todos os quais parecem ter sido impregnados com o novo espírito - já estivessem mortos, são vistos como pioneiros desse novo despertar (MANCHESTER, p. 53, 2004).

Logicamente, que nem todos os historiadores compartilham desta opinião. Mesmo que sua Divina Comedia fosse uma obra multifacetada, para Hilário Franco Júnior, Dante não deixaria de ser um representante conservador de seu tempo ao defender ideais medievais como os princípios católicos:

 (...) a obra de Dante Alighieri, escrita entre 1307 e 1321mas de espírito pertencente ao século XIII é, talvez o maior painel existente sobre a Idade Média. A viagem que nele Dante empreende pelo Inferno, Purgatório e Paraíso é o pretexto para encontrar inúmeros personagens (políticos, burgueses, filósofos, poetas, santos, teólogos) e a partir deles tecer comentários sobre praticamente tudo. Assim o poeta reuniu profundos conhecimentos do saber oficial de sua época com elementos tirados da tradição populares. Aliás, sua intenção divulgadora transparece, quando afirma ter escrito a Commedia em ‘linguagem vulgar que as mulheres utilizam em suas conversações diárias’ para ser entendido por maior numero de pessoas. Era o grande manifesto da laicização da cultura (FRANCO JÚNIOR p. 1986, p. 140).
Se Dante parecia evocar o cristianismo, não era o da sua época, e sim aquele cristianismo que havia fundado a Igreja e essa por suas atitudes controversas teria sido esquecido por ela. O poeta florentino para muitos parece mais laico que católico. Em sua obra tudo coube: o islamismo, a filosofia grega, a teologia católica, o romance; tudo ocupava a sua obra. Exilado de Florença o ex-priore que defendia os guelfos contra os gibelinos (facções que lutavam pelo poder da cidade ora defendendo ora atacando o clero2), escreve a partir da percepção que tem do mundo a sua volta, como bem coloca Buckhardt: “Se tomarmos Dante e seus contemporâneos como evidência, descobriremos que a filosofia antiga entrou em contato primeiramente com a vida italiana no aspecto em que ela oferecia o contraste mais marcante com o cristianismo e epicurismo”.(BUCKHARDT, 1991, p. 306).


2              Clero: conjunto de sacerdotes responsáveis por um culto religioso. Existe o clero regular e o secular. Também conhecido como alto clero (papa, bispos e arcebispos) e baixo clero (diáconos e monges).2


Iria para nenhum Paraíso ou qualquer lugar celeste, ela morreria unto com o corpo. Algo que Dante um católico abnegado à teologia de Tomás de Aquino rejeitava veementemente
 O não pensamento de Epicuro (ac. 341-270 ac) residia na idéia que alma humana. O contato entre o cristão e a filosofia grega, gerava um conflito existencial, ao mesmo tempo em que uma abertura para novas possibilidades de raciocínios que fugiam do controle da teologia.
Se a obra de Dante tem uma faceta conservadora (ele impregna sua ida ao Inferno e o Paraíso com uma visão teológica de São Tomás de Aquino a ponto de encontrar com o próprio no Quarto Céu celestial) a sua outra faceta seria como já foi registrado anteriormente é sua crítica severa a uma Igreja que usa da simonia e da venda de Indulgências como mantenedora de um poder que a distancia do propósito cristão. Mas além disto, talvez a maior contribuição de Dante tenha sido sua transparência em mostrar que sua poesia era totalmente calcada na cultura grega.
A obra Eneida de Virgílio sofre uma releitura por parte de Dante ao se colocar como protagonista da historia no lugar do troiano Enéas que é expulso de sua terra após a tomada de Tróia pelos espartanos. A história de Enéas é narrada por Virgílio da seguinte maneira: durante a fuga seu pai Anquises morre sem relatar que profetizara que seu filho seria o fundador de uma nação próspera (tudo indica que seria a Itália). Assim como Ulisses, Enéas viaja por todas as regiões próximas do que se tornaria a Itália, como a Trácia, a ilha de Delos, Istrofades e o litoral da Sicília. Chegando em Cartago conheceria Dido, irmã de Pigmaleão e rainha daquela nação. Ela seria sua grande paixão, pois, Enéas perdera sua esposa durante a fuga de Tróia. Como era condenado a ser um errante pelos deuses, Enéas acaba deixando Cartago abandonando Dido. Esta por amor fica em desgosto e morre. Preocupado em saber da profecia de seu pai, Enéas ruma para a costa da Itália para encontrar a Sibila, sacerdotisa que deveria levá-lo para o Tártaro para assim Enéas poder ouvir a profecia da boca de seu próprio pai Anquises.
O Tártaro era a região dominada pelo deus Plutão (Hades), formado pelo rio Aqueronte (rio de água escura e putrefata), o rio Estige (rio dos vapores nauseantes), rio Flegeton (o rio de fogo) e o campo das lagrimas e o Elíseos.  Para poder atravessar toda a região e não ser atacado pelas Fúrias e nem o cão Cérbero, Enéas e Sibila viajam no barco de Caronte. Após ultrapassar as muralhas da cidade infernal chamada de Dite, Enéas finalmente encontra o pai e sua amada Dido no campo Elíseos. Descobre que seu destino é guiar uma grande nação e sendo assim não pode ficar com os seus no Inferno, ainda mais que ele não havia morrido. (continua)
           


   

sábado, 11 de junho de 2011

Igrejas Medievais: as várias formas da casa de Deus

Após 249 anos de perseguição impostas pelos imperadores romanos, o cristianismo deixou de ser uma reunião de fanáticos religiosos e passou a ser a religião principal, graças a conversão de Constantino no seculo V.

O surgimento de Constantinopla do lado oriental da Europa, seria uma divisão profunda posteriormante para os cristãos gerando as igrejas romanas do ocidente e do oriente. Constantinopla seria invadida pelos turcos e estes continuariam com o cristianismo, porém avesso aos mandos de Roma. O próprio cristianismo como base religiosa gerou inumeras interpretações devida a generalização e universalização da mensagem do Cristo.
    
Tão universal quanto a mensagem do Cristo seria a estetica adotada pelas igrejas para expandir o messianismo. As primeiras igrejas cristãs eram inspiradas nas catacumbas romanas: simples e com poucos desenhos nas paredes feitos por artistas anônimos. Depois que os romanos adotaram a religião dos perseguidos as igrejas passaram a adotar a estética romana: templos com colunas e arcos. Muitos destes templos se pareceram com as basilicas (predios administrativos romanos) e com o famoso Panteão onde no lugar dos deuses gregos eram colocados apostolos, anjos e santos cristãos.
    
As igrejas chamadas de românicas tinham uma estética de muitos desenhos e imagens do Cristo Pantacrator. As janelas eram pequenas o que prejudicava a iluminação do recinto. Antes dela houve a igreja bizantina com os seus ícones estilizados e que inspiravam as iluminuras. Um detalhe interessante que vale ressaltar é que os personagens descritos nas paredes não tinham a imagem da beleza grega como regra, já que a Igreja presava mais a mensagem que a forma. Assim tinhamos um Cristo gigantesco e anjos pequenos e magros ao seu redor pintados de azul, amarelo ouro e vermelho.
    
no seculo XII apareceriam as igrejas góticas, com seus demônios de pedras em seus parapeitos e colunas de nervuras e torres altissimas. Esta estetica arquitetônica apareceu no Sul da França e se alimentava das supertições pagãs (por isto as colunas e paredes eram decoradas com folhagens e criaturas horriveis). O que mais chamava atenção nestas igrejas eram realmente os vitrais coloridos que quando ganhavam os banhos de raio de sol iluminavam o recinto de foma sublime.
      
Enfim, ao termino do século XIII e inicio do XIV surgem as igrejas renascentistas. A mais conhecida delas foi construida pelo arquiteto e pintor Bruenelesch, chamada de Santa Maria del Fiore. Como o próprio nome diz a Renascença foi a volta do pensamento greco-romano em termos estéticos e comportamentais. Pintores como Michelangelo e Leonardo da Vinci pintavam figuras religiosas inspirados nos corpos das estatuas gregas vistas como pefeitas, enquanto as igrejas tinham suas enormes cúpulas que abraçavam o  céu.Claro, depois veriamos a pompa e o exagero das igrejas barrocas pós Reforma Protestante. Hoje as igrejas pós moderninsmo são bastante modestas e até pobres (algumas delas) de estética seja pelo advento do protestantismo ou das varias releituras da mensagem cristã que buscam  mais arrebanhar fiéis sem usar o artificio da arte de outrora.

sábado, 4 de junho de 2011

Sessão Espada & Fantasia

O início do novo milênio foi um marco para quem curte as histórias de guerreiros e magias. Me lembro que 1999 coroava o fim de uma era em que a internet era o maior avanço tecnológico e social que haviamos chegado. Filmes como Hackers e Matrix contavam o épico do homem moderno que estava conectado e escravizado pelas máquinas. Aliás, o tema do homem X máquina já era debulhado desde os anos 80 com o Exterminador do Futuro de James Cameron.

Em contra partida as histórias de cavalarias e guerreiros empunhando espadas estava em decadência e de vez em quando um filme como Coração Valente ou Gladiador chamavam a atenção do publico que tinha saudade de filmes de capa e espada. Pois bem, em pleno anos 2000 surge o avassalador Senhor dos Anéis de Peter Jackson. O filme de 3 horas de duração era apenas a introdução de um épico que ganharia seu alge com o Retorno do Rei.

Que alegria eu tive em ir ao cinema e ver a obra de J. R. R. Tokien ganhando vida com os efeitos especiais nunca vistos antes. O mais curioso foi ver como a obra de Tokien havia influenciado todo um gênero de intretenimento. Quem assistia os episódios do desenho Caverna do Dragão, He-man e Thunder Cats percebia os ecos de Tokien neles.
Vou mais longe e trago de minha memoria os filmes de monstros mitologicos feitos por Harryhausen que tinham um 'quê' de Senhor dos Anéis neles. O estranho é perceber que a molecada de hoje que está lendo Tokien nem sabe da influencia dele na grande midia. Filmes como A Lenda de Ridley Scott ( o mesmo que dirigiria mais tarde o Gladiador) e O Dragão e o Feiticeiro em pleno anos 80 já faziam referência ao gênero espada e Fantasia, fora talvez, o melhor filme deste genero: Conan O Barbaro!

Recentimente assisti a animação O Senhor dos Anéis (1978) dirigido pelo animador Ralph Bakshi. O cara é tão aficcionado pelo gênero espada e magia que faria um desenho super bacana chamado de Fire An Ice(1983). Com qualidade digna de um anime japonês Ralph Bakshi é conhecido por fazer desenhos super adultos e eletrizantes. Outro que foi Influenciado por Tokien foi Jules Bass, animador também, americano como Bakshi e socio de Arthur Rankins. Os dois fariam os desenhos animados dos Thunder Cats e outras animações de sucesso dos anos 80. Eles produziram um desenho super bacana chamado de O Ultimo Unicornio (1982). Outro fã de Tokien foi Ivan Reitman que produziu um super desenho para o cinema chamado Heavy Metal (1981) na qual uma das historias era a cara das obras de Tokien chamada de Taarna. O ultimo desenho gênero espada e fantasia que saiu foi Dante's Inferno feito pelos animadores japoneses para divulgar um jogo do mesmo nome para XBOX 360.

sexta-feira, 3 de junho de 2011

Máscaras da ilusões: as nossas muitas faces


O homem sempre procurou explicar o que ele considera inexplicável ou sem sentido. Os homens das cavernas acreditavam que desenhando bisões nas paredes das cavernas estariam facilitando a caçada a fera. Os raios que caiam e derrubavam as árvores eram considerados a fúria da divindade sobre os homens. O mesmo acontecia com as tempestades e terremotos.

Foi o medo pela fúria da divindade e talvez o desejo de manipular tal poder que surgiram os rituais religiososo. Os homens primitivos passaram a elaborar formulas e imolações para falar com o sobre-natural e terem uma fusão com ele. Nas tribos africanas e indigenas é comum o uso de suportes como cajados e poções, mas principalmente de máscaras e pinturas corporais.
Em particular as máscaras geram um fascínio em especial por não terem uma função imediata como um pote ou uma lança. Assim como as estátuas a sua função é tão subjetiva que chega a ser ignorada. Podemos viver sem usar uma máscara ou contemplar uma estátua, porém , existe uma razão para construirmos tais coisas.
Para as tribos primitivas as máscaras servem como um meio de conexão, um 'telefone celular', para falar com a divindade. Somente o shaman pode usar esta máscara pois ele domina o codigo  especifico para se comunicar com a divindade. Aliás, qualquer coisa que proteja a cabeça, o orgão que rege nossas ações, tem um valor mais que especial.

Os guerreiros astecas usavam as cabeças de jaguar como elmo, assim absorvem o poder do animal para matar os inimigos. Os elmos dos guerreiros gregos eram 'batizados' nos templos em nome de Apolo e assim esperavam que o demonos 'espirito de heroí' viesse sobre suas cabeças. No mundo atual falamos muito em pessoas 'mascaradas' ou de 'duas caras', porque na nossa sociedade precisamos infelizmente termos mais de uma face para viver em um mundo onde julgar o outro é quase um esporte.


Talvez seja por isto que as máscaras de Halloween e de Carnaval façam tantos sucessos pois revelam o que escondemos no nosso cotidiano. Quem nunca aprontou no Carnaval ou no Halloween porque estava mascarado e assim achava que não seria reconhecido?

quinta-feira, 2 de junho de 2011

Trabalho de monografia Parte IV: continuação

1.4- Poder estabelecido

Parece complicado entender como a Igreja se tornou poderosa ideologicamente, quando vemos as guerras dos Macabeus e a perseguição romana a Baco. A Igreja herdou estes fatos e os levou a adiante. A Europa dividida entre a cultura românica e a germânica era invadida por hunos e bárbaros orientais. Quando o Cristianismo se ascendeu com a decadência do Império Romano, seus representantes passaram a defender a unificação do continente europeu através do rei franco Carlos Magno. Como instituição que tinha reis convertidos na suas fileiras de fieis, e assim podia justificar como única religião representante de Deus na Terra, a Igreja literalmente abraçou a unificação do território europeu. O continente europeu estava dividido entre os antigos descendentes de um Império Romano decadente e as tribos germânicas. Ambos eram atacados pelos hunos e outros bárbaros orientais. Mesmo com várias tribos vivendo com dialetos próprios e variáveis culturais o cristianismo investiu em uma unificação, por vezes forçada e com intuito ideológicos de dominação que levou a uma efêmera coalizão entre o mundo dito clerical (o mundo dominado e justificado pela Igreja) e o mundo laico (o mundo dos povos germânicos divididos em tribos como os saxões e os celtas) com a chancela de Carlos Magno como atesta Franco Júnior:

Foi então que se atingiu, ilusoriamente, uma nova unidade política com Carlos Magno, mas sem se interromper as fortes e profundas tendências centrifugas que levariam posteriormente à fragmentação feudal. Contudo, para se alcançar essa efêmera unidade, a dinastia carolíngia precisou ser legitimada pela Igreja, que além do seu poder sagrado se via como única e verdadeira herdeira do Império Romano. Em contrapartida, os soberanos carolíngios entregaram um vasto bloco territorial italiano à Igreja, que então se corporificava e ganhava condições de se tornar uma potência política atuante.(JUNIOR, 1986, p. 13).

Com o tempo como já foi relatado, a Igreja para poder se impor ideologicamente demonizou as crenças das tribos convertidas germânicas. Para isto, construiu templos católicos em locais sagrados pertencente à sociedade laica e convertia deuses em demônios e transformava outros em santos cristãos. Os laicos (a sociedade cristianizada, mas que não tinha contato com a filosofia e nem com o intelectualismo greco-romano) divinizavam os elementos naturais e via o contruatualismo como uma relação íntima e direta com o sobrenatural sem precisar de intermédio de mestre espiritual. Ironicamente com medo de perder fieis a Igreja permitiria o contratualismo entre o crente e o santo de devoção, uma substituição aos antigos rituais pagãos de sacrifício de animais ou invocação de forças.

O camponês humilde longe das cidades ainda temia a natureza e a escuridão, cabia a Igreja alertá-lo dos demônios e quimeras, que o próprio camponês carregava desde suas crenças ancestrais. Isto era o imaginário popular, um conjunto de imagens construídas pela sociedade. O imaginário com a junção da mentalidade que Le Goff definiria como uma unidade individual que transitava para o coletivo. Aquilo que todos os indivíduos de um grupo tinham em comum e que se manifestava mesmo que inconscientemente. O imaginário e a mentalidade (ideia e instrumentos culturais que os legitimam) gerariam todas as imagens que aparecem nas gárgulas das catedrais, na crença em lobisomens e vampiros e claro, em demônios que apossavam da alma dos que não seguiam os dogmas da Igreja.
Esta junção da visão da Igreja a crenças que lhe seriam dispares surgiu lentamente, ainda quando cristãos ganhavam notoriedade em Roma e assim ‘engoliram’ a arte clássica pagã, como percebe Panofsky em seu Significado das Artes Visuais: “(...) a figura de Orfeu foi empregada para representar Davi ou quando o tipo de Hércules puxando Cérbero para fora do Hades foi usado para retratar Cristo tirando Adão do Limbo”.(PANOFSKY, p. 68, 2004). Logicamente, que existe os fatores composicionais e de texto para se entender este entremeio do clássico e o não-clássico. Os monges copistas dono do saber mitológico greco-romano tinham acesso à palavra, já que o monge que deveria confeccionar a imagem tinha o texto como referência e torná-lo contemporâneo para os seus. Para isto, traduziam em imagens textos que não eram descritivos. Assim sendo um personagem greco-romano poderia receber uma roupagem medieval. Pois, o conteúdo da mensagem era mais importante do que a sua forma. Os monges artistas usavam as obras romanas (formelas e esculturas) como base composicional procurando não exaltar os detalhes do corpo (a alma era o bem precioso e o corpo era corrupto). Por isto, a estilização das figuras e o pouco cuidado no retrato se desligando do naturalismo da arte grega e romana.



CAPITULO II

DANTE E BOSCH

2.1-Representantes do belicismo

No Paraíso da sua Divina Comedia, Dante Alighieri (1265-1321) explanou sobre o geocentrismo defendido por Tomás de Aquino, usando a sua musa Beatriz como símbolo da fé e do conhecimento teológico. No Paraíso todo o conhecimento astronômico da Idade Média se mescla à filosofia teológica e assim procura explicar elementos tidos como não humanos como os níveis de planeta e sua relação com as moradas celestiais: “Na oitava esfera luzem muitos lumes, os quais se distinguem entre si pelo seu vulto e pela qualidade da luz que emitem. Se a tenuidade ou a densidade deste corpo desse causa às sombras e às luzes, decerto todas teriam virtudes iguais similares e todas seriam iguais”.(DANTE, canto II, p. 236).
Neste mesmo canto, Dante além demonstrar por meio das explicações de Beatriz, sobre como o Paraíso tem existência, demonstra também que nenhum conhecimento humano poderia alcançar o saber divino e toda a explicação do homem para entender o mundo seria sinal de ignorância sobre este saber. Um tipo de conhecimento que platonicamente falando seria somente de alcance dos sábios que podem desafiar sair da caverna ou na teologia cristã de Tomás e Dante, ir além do mundo matérico.
Ainda na Divina Comedia no canto XVI no poema sobre o purgatório dos pecadores da ira, Dante discute o livre-arbítrio e resume todo o pensamento tomista sobre Deus como motor do universo e percebe que tudo gira em torno do divino:

Vós, os viventes, costumais atribuir ao Céu as causas de todos os efeitos, ligando, por necessária dependência que a todo o mundo rege, o bem e o mal. Se assim realmente acontecesse, destruído o livre-arbítrio, não receberia o homem o prêmio justo e o castigo merecido. De fato, os vossos movimentos são iniciados com a permissão divina. Não digo todos; mas admitindo que assim ocorra com todos; ainda tendes a luz da razão que vos permite discernir entre o bem e o mal. (DANTE, canto XVI, p. 168).

O livre-arbítrio discutido na obra de Dante ganha dimensões gigantes nas pinturas do pintor holandês Hieronymus Bosch (1450-1516). Artista dos Países Baixo, Bosch tinha uma visão totalmente negativa e por que não dizer não tomista. Pois, se Tomás de Aquino considera que o homem ainda tem uma escolha mesmo que Deus ainda seja o impulsionador das ações humanas. Bosch percebe que toda a ação do homem é contraditória a Deus. Em obras como a Carroça de Feno (provavelmente séc. XVI) e Távola dos Sete Pecados (c.1490) (figura 01), Bosch expressa em pinceladas um Deus que está distante do homem enquanto este se entrega voluntariamente ao pecado, deixando o motor divino que guia para trás. O homem é responsável pelas suas escolhas e a ação de Deus é punitiva. Tanto que as pinturas finais dos seus tripticos sempre terminam com o castigo humano no Inferno.
No canto que encerra sua viagem pelo Purgatório, Dante descreve alegoricamente a Igreja como representante de Deus na Terra. De certa forma ele parafraseia o profeta Ezequiel, que em sua visão vê o carro divino protegido por seus querubins. Dante coloca o carro divino de Ezequiel como a própria Igreja que é guiada por Cristo (metaforicamente no poema um grifo) e junto destes seguida pela comitiva de apóstolos e anciãos sábios da Bíblia. Contudo, o carro de Deus no poema de Dante é perseguido e atacado por uma águia e uma raposa enquanto uma meretriz ao longe se enamora com um gigante.
Como se trata de elementos alegóricos, a raposa a meretriz o gigante e a águia, significam os flagelos da Igreja: a águia as perseguições, a raposa a heresia, a meretriz, a cúria romana que deseja poder e o gigante seria o Rei Felipe o Belo, que para Dante representaria a França, inimiga da igreja italiana.
Se o Canto XXXII de Dante percebe as contradições e fragilidades da Igreja: “Ereta, qual rocha saliente em alto monte, sentada sobre o carro vi então nua meretriz, os lascivos girando à volta. Como pretendente tê-la para si unicamente, à sua retaguarda postava-se um gigante, e os seguidamente se beijavam”.(DANTE, Canto XXXII, p.222), a historia registra que concretamente os seus desatinos, como bem atesta Jacques Le Goff (2008) ao afirmar que a Cruzada é mais que uma guerra santa, na qual a justificativa da guerra é feita em prol de um bem maior, mas que a guerra deflagrada pela Igreja é uma guerra declarada por Deus contra os que não o seguem segundo o ponto de vista dos cristãos fervorosos da época.(continua)